GESTOS PERIGOSOS

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

O HOMEM QUE CONTAVA DINHEIRO


Conheci um homem, há alguns anos, que destinou sua vida a juntar dinheiro. Segundo parentes, desde de pequeno Justino guardava num cofrinho todos os tostões que conseguisse. Não os gastava, nem por necessidades. Não comia doces e outras guloseimas apreciadas pela criançada. Engolia a água na boca, pois sua satisfação se encerrava na economia que fizera ao não gastar com gulodices. Remédios? Comprava-os quando estritamente precisos, sempre com a ajuda de alguém. Queixava-se do mal que o afligia e dos poucos trocados que tinha para adquirir os medicamentos.
Jamais contava aos outros quanto tinha guardado. Segredo absoluto. Vestia-se mal, alimentava-se mal, enfim, vivia às custas de aparências próximas à miséria. Pobreza camuflada. E todos ao seu redor nutriam a mais profunda piedade do Justino, o que, vez ou outra, rendia-lhe doações de todos os tipos. Roupas, calçados, alimentos e até dinheiro, o que mais lhe interessava. Emprego? Trabalhava numa firma importadora como ajudante geral. Não estudou o quanto devia, para economizar. E do cofrinho da infância, Justino rendeu-se a uma conta bancária para guardar suas economias.
Sua residência, uma casa alugada na periferia da cidade, tinha apenas o suficiente para ele sobreviver. Um fogão, comprado de segunda mão. Uma geladeira muito antiga. Uma cadeira. Uma cama e um pequeno guarda-roupa, no qual ele acomodava roupas e mantimentos. Nada mais. Não precisava de muitas coisas, assim pensava, pois jamais recebeu ou receberia visitas. Podendo sempre economizar, tudo estava bem para Justino.
Uma das exigências de Justino para si mesmo era nunca se apaixonar. Mulher nenhuma haveria de dividir com ele seus bens monetários. Sempre que precisava aliviar-se nas necessidades fisiológicas, recorria ao prazer pago. E sempre o mais barato, para economizar. Jamais usou preservativos, uma vez que, no seu entender, era muito caro para apenas um minuto de satisfação. Desse modo, enchendo sua conta bancária de tostões e mais tostões, Justino considerava-se uma pessoa inteligente. Ia vivendo, embora à margem do mínimo conforto. O mais importante na vida, segundo a filosofia de Justino, era contar dinheiro. Como ele o fazia todas as noites, antes de dormir. Contar dinheiro era sua oração preferida. Adormecia no embalo do tilintar das moedas.
- Estou esperando um filho teu. – anunciou-lhe uma das prostitutas baratas da sua agenda de prazeres. – E eu não tenho como cuidar do menino.
Justino podia ser o maior avaro do mundo, mas irresponsável jamais. Sem atinar com as malandragens do submundo, registrou em seu nome o garoto, imediatamente ao seu nascimento: Justinho Júnior. Sem muito esforço, a mãe conseguiu o objetivo. Juntou seus trapos e mudou-se para a modesta casa do nosso contador de dinheiro. E começaram as exigências: novos móveis, roupas novas, geladeira fost free... Tudo em nome da boa educação para o Júnior. Aos poucos, Justino deixou de contar moedas todas as noites. Não sobrava muito para tanto. E teve que mexer na conta bancária, coisa que nunca o fizera desde sua abertura. Aos poucos... Teve um enfarto e morreu. A mãe do Júnior transformou-se numa dama. O filho abriu um cabaré. Mas, aos poucos, tudo voltou à forma antiga. E, aos poucos, a conta bancária do Justino cravou-se no déficit. Acabou o dinheiro... Acabou. Como o Justino, hoje acomodado num túmulo para indigentes.

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