GESTOS PERIGOSOS

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

FORAM OS COXOS QUE...


Roberto Villani

Início de 1970.
Trabalhava comigo, na Escola Profissional de São Paulo, em Cubatão, o Prof. Hyjalmar Rubo.
Ele era o secretário geral da EPSP.
Eu, além das funções administrativas, coordenava o teatro entre alunos.
Na verdade, era o TERV desenvolvendo-se.
Tornamo-nos amigos, do que me orgulho.
O Hyjalmar sempre foi uma pessoa de primeiro nível, em todos os sentidos.
Caráter, personalidade, humano e, sobretudo, amigo.
Era um dos proprietários do Colégio Ateneu Santista, em Santos.
E secretário geral no Colégio do Carmo, da mesma cidade.
Um dia, no período da tarde, o Hyjalmar foi à cozinha da escola para tomar café.
No refeitório, eu ensaiava uma peça teatral com os alunos.
O Hyjalmar ficou entusiasmado com o que via, adolescentes engajados num trabalho especial, com muita vontade de vencer, de sucesso.
Depois de um tempo, o telefone tocou e ele afastou-se do refeitório.
- Você aceitaria dar aulas de teatro no Ateneu? Tem um pessoal lá louco pra fazer teatro... O que você me diz? – indagou o Hyjalmar à saída do expediente.
Estávamos regressando a Santos, num microônibus.
Alguns professores também voltavam e presenciaram o inesperado convite.
- Professor, você vai me resolver um problema danado. – disse-me o Prof. João Pereira dos Santos Neto, outro proprietário e diretor do Colégio Ateneu Santista. Tem alguns alunos me exigindo aulas de teatro. E eu não encontrava um professor com experiência...
Nossa reunião demorou uns trinta minutos.
Decidimos horários, honorários e outros detalhes. Saímos, eu, o Prof. João e o Hyjalmar em direção ao pátio do colégio, local escolhido para as minhas aulas.
No caminho, alguém me abordou:
- Você é quem vai dar aulas de teatro? – um aluno, portando uma bengala, abriu um sorriso. – Uma professora me contou. Disse que você viria hoje...
Carlos Alberto Lopes, o aluno que aporrinhava os diretores do Ateneu pedindo aulas de teatro.
- Vamos organizar tudo direitinho. Pode contar comigo pra tudo que for preciso.
– Eu via no Carlos o mesmo entusiasmo dos meus alunos de Cubatão. E isso me motivou desde o princípio.
Criamos o CAST – Clube Ateneu Santista de Teatro.
As aulas e os ensaios eram no período noturno, ao final das aulas.
O Carlos comprometeu-se a divulgar a novidade nas classes, convidando os alunos interessados em participar do CAST a inscreverem-se com ele.
Com toda a dificuldade de subir escadas, de caminhar, nada o impediu de visitar cada sala de aula, nos períodos da manhã e da noite.
Em São Paulo estavam apresentando a peça A Cantora Careca, de Ionesco. Teatro do Absurdo. Fiquei fascinado pelo texto e pela novidade, pelo menos para mim na época.
Resolvi então pesquisar e escrever um texto do absurdo.
Seria a primeira montagem teatral do CAST. Título: FORAM OS COXOS QUE ME MATARAM. Resumo: as peripécias de um agente funerário, o absurdo de um morto manifestando-se dentro de um caixão e as encrencas da família.
Para não deixarmos dúvidas, nome do morto: CARLOS ALBERTO LOPES.
Não preciso dizer que a estréia foi sucesso.
Diretores, professores, funcionários, alunos e familiares lotaram o pátio.
Todos nós vivemos uma noite de glória.
Mas no meio dos atores e das atrizes, entre diretores e professores, havia um que vibrava mais que todos, o Carlos Alberto.
O que ele tanto sonhou para o Ateneu tornava-se realidade.
Um grupo de teatro, inteiro.
Na verdade, o CAST foi proposta dele junto ao colégio.
Os anos passam e agente perde amigos ao longo da vida.
Fiquei alguns anos sem rever o amigo Carlos Alberto.
Numa manhã de domingo, passando pelo pedágio da balsa de travessia para a cidade do Guarujá, na poltrona de passageiro do carro de meu genro, ouvi em alto e bom tom.
- Foram os coxos que me mataram. – e enquanto cobrava, lá estava o Carlos Alberto falando o texto da inesquecível peça.
Ele sabia o texto inteiro, decorada palavra por palavra. Será que ele ainda lembra?
E novamente os anos passaram.
Nunca mais o vi.
Guardo até hoje um recorte de jornal de Cubatão, no qual ele escrevia, com comentários amáveis a meu respeito.
E as nossas histórias passaram distantes.
Mas não nos esquecemos.
Mantemos nossa amizade como sempre.
Hoje, depois de tanto tempo, reencontrei-o nas páginas do jornal Anacoluto, dele, na Internet, no qual nos mostra toda a sua capacidade criativa, para escrever, para doar, para aglutinar.
Minha homenagem a você, amigo Carlos Alberto Lopes.
Pelo Ateneu Santista, pelos os Coxos, por nossa imorredoura amizade.
Que Deus te abençoe.
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VILLANI, ISSO REQUER UM COMENTÁRIO...
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De fato, tudo isso aconteceu... foi assim que conheci, em 1970, Roberto Villani e assim, meio na porrada, na marra, nasceu o Clube Ateneu Santista de Teatro.
O tempo passou...
Villani se afastou de Santos, perdemos contacto, e a poucos meses, consequimos refazer contacto, e o convidei para uma coluna, neste meu ANACOLUTO, e ele me deu a honra de aceitar.
A vida dá suas voltas, e as vezes, nos coloca lado a lado, com quem nunca se queria ficar distante.
É a vida, fazendo o destino provar que nem tudo esta perdido como se pensa, e que por mais que se sinta que as pessoas distantes estão, um dia, quando menos se espera, estão elas ali, e tudo recomeça, como se nem um dia, tivesse se passado.
Bem Vindo ao ANACOLUTO, velho amigo!
Que aqui fique por muito tempo, pois a casa é tua!!!!

Um comentário:

  1. Tive a honra e a alegria de participar do 1º elenco dos COXOS. Eis o Elenco: Sandra Regina, Fernando Pereira (eu) João Carlos, Calos Alberto, José Ribamar e Eleonora.
    Quero dizer também que o CAST e O Prof. Roberto Villani me ajudaram a me relacionar com as pessoas, antes disso eu era calado, (quase mudo) e com problemas seríssimos de relacionamento, muito tímido ao ponto de fugir das pessoas. Depois com as aulas e laboratórios, ensaios e estreias desapontei e fui até campeão em vendas onde trabalhava. Obrigado prof.Villani, obrigado CAST!

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